Carcinogênese e Envelhecimento
O risco de câncer aumenta com a idade. Isso acontece, em parte, porque as mutações
genéticas que surgem de erros de replicação do DNA e a exposição a carcinógenos
ambientais se acumulam à medida que envelhecemos.
O câncer é um conjunto de doenças que envolvem alterações no status e na expressão de
múltiplos genes que conferem uma vantagem de sobrevivência e um potencial
proliferativo inalterado para células somáticas ou germinativas. Alterações nesses genes –
principalmente nas três classes principais, ou seja, (proto) oncogenes, genes supressores
de tumor e genes de reparo de DNA – contribuem coletivamente para o desenvolvimento
do genótipo e do fenótipo do câncer que resiste aos mecanismos de morte natural, que
são inerentes e embutidos nas células (apoptose e processos semelhantes), juntamente
com a desregulação dos eventos de proliferação celular.
Uma das características comuns ao envelhecimento e ao câncer é a ocorrência de
instabilidade genômica. O DNA humano é vulnerável a mutagênicos, como radiação
exógena e radicais livres endógenos, aos quais estamos expostos constantemente ao
longo da vida. De fato, as células do corpo humano passam por bilhões de divisões
celulares, durante as quais o DNA é replicado, sempre com o risco de introduzir ou sofrer
eventos mutacionais. Essas mutações inevitáveis, em sua maioria, são inofensivas, sendo
corrigidas pelo sistema de reparo do DNA. No entanto, um certo grau de danos
acumulados no DNA ocorre com o tempo. A instabilidade genômica nas principais funções
reguladoras é a mais proeminente “marca de ativação”, que leva as células cancerígenas a
adquirir muitas das características do câncer, como autossuficiência em sinais de
crescimento e aumento do potencial metastático.
A manutenção da estabilidade genômica parece ser uma função essencial para prevenir
não somente o desenvolvimento do câncer, mas também os processos de
envelhecimento. A instabilidade genômica e as mutações podem contribuir para o
envelhecimento de várias maneiras, desde pequenas mutações pontuais até grandes
translocações e deleções. Nas células somáticas, pode originar disrupção do fenótipo por
meio de alterações na sequência de codificação da proteína; provavelmente, a alteração
de sequências reguladoras é a mais comum, levando, eventualmente, ao declínio
progressivo da função do órgão por conta das alterações da homeostase.
Na Figura 18, um modelo simplificado mostra o envelhecimento e o câncer da perspectiva
de alterações no pool de células-tronco e progenitoras. Ao longo da vida de um
organismo, as células de vida longa (como as células-tronco) acumulam danos no DNA em
virtude de vários tipos de estresse, incluindo oxidantes intracelulares gerados pelo
metabolismo normal. O destino habitual para essas células-tronco danificadas é sofrer
parada de crescimento, apoptose ou senescência. À medida que mais e mais células-
tronco se retiram do pool proliferativo, há uma diminuição no número total e/ou na
funcionalidade de células-tronco e progenitoras. Essa diminuição predispõe o organismo a
uma homeostase tecidual e a uma capacidade regenerativa prejudicadas, podendo
contribuir para o envelhecimento e para o surgimento de patologias relacionadas à idade.
Presumivelmente, algumas células raras podem escapar desse caminho padrão,
adquirindo mutações adicionais que permitem que elas continuem a proliferar mesmo no
cenário de DNA danificado. Essas células em proliferação, mas danificadas, podem
fornecer as sementes para futuras malignidades. Nesse cenário, tanto o câncer quanto o
envelhecimento resultam, principalmente, do acúmulo de danos no compartimento de
células-tronco e progenitoras. Mutações que permitem que as células-tronco continuem a
proliferar no cenário de sinais normais de interrupção do crescimento, como danos ao
DNA (p. ex., perda de p16INK4a ou reativação da telomerase), expandiriam
temporariamente o pool de células-tronco e, portanto, retardariam as patologias
relacionadas à idade. A longo prazo, essas mutações também aumentariam a
probabilidade de câncer.
Durante o envelhecimento normal, as células-tronco acumulam danos e subsequentes
alterações dependentes do estresse, como desrepressão do CDKN2a (p16 INK4a/ARF)
lócus ou encurtamento dos telômeros. Isso acarreta aumento da abundância de células
senescentes (grandes células hexagonais – Figura 18) dentro de tecidos diferenciados. As
lesões pré-neoplásicas, decorrentes diretamente de células-tronco ou de células mais
comprometidas, sofrem rápida proliferação (pequenas células marcadas com asteriscos –
Figura 18). Essas células tumorais pré-malignas acumulam danos rapidamente, em parte
por causa da presença de oncogenes, levando a uma maior proporção de células tumorais
que se tornam senescentes (células marcadas como hexágonos preenchidos com a cor
branca – Figura 18). A progressão tumoral para malignidade total é favorecida quando as
células tumorais adquirem mutações que prejudicam o programa de senescência (p. ex.,
mutações em Trp53 ou CDKN2a).